Franz Kafka no traço da quadrinista e ativista feminista francesa Chantal Montellier, na adaptação de 'O Processo'.
Erick Vizoki
A situação no Brasil suscitou recentemente e por várias
vezes comparações à obra '1984' (publicada em 1949), de George Orwell, e com todos os motivos.
O livro relata a perseguição aos cidadãos por um Estado
hipotético e fascista (Oceania) que faz uso principalmente da informação e da comunicação (coincidência?).
No conto há, inclusive, um "Ministério do Pensamento" e um
"Ministério do Amor"! Seria outra coincidência ou a ficção se tornando
realidade?
Mas a coisa destrambelhou para uma situação ainda mais
absurda, quase inconcebível, numa realidade minimamente aceitável. O que podemos
chamar de uma versão "kafkiana" da nossa realidade.
O escritor tcheco Franz Kafka (03/07/1883 – 03/06/1924) é conhecido como o "Papa
do Absurdo" por conta de suas obras quase totalmente metafóricas, que
retratam um universo que inicialmente parece inconcebível, mas que é, na
verdade, uma crítica a uma realidade que vivemos muitas vezes sem perceber. Eu
até diria que Kafka profetizou o que chamamos hoje de "o novo
normal".
Uma de suas obras mais conhecidas, considerada um dos
maiores clássicos da literatura, é 'O Processo' (1925), que ganhou duas adaptações
para as telas, sendo a primeira dirigida pelo visionário Orson Welles (1962) e estrelada por Anthony Perkins, o lendário psicopata
Norman Bates de ‘Psicose’
(1960). O outro é de 1993, dirigido por David Hugh Jones, disponível gratuitamente no YouTube, dublado em português.
O livro conta a história de Joseph K., um servidor público
que certo dia é acordado em sua casa por policiais que lhe informam estar preso
devido a um processo movido por ninguém sabe quem, por um motivo desconhecido,
e sem o devido procedimento legal. Outra coincidência?
O livro, a certa altura, faz menção a um conto do próprio
Kafka chamado 'Diante da Lei'. Esse conto (que eu adoro), por sua vez, conta a
surreal história de um camponês simples que resolve conhecer a Lei e vai até
sua porta. Lá ele encontra um guardião enorme e poderoso que impede sua entrada
e ainda o ameaça se ele tentar entrar, afirmando que mesmo que o pobre homem
conseguisse ultrapassar, encontraria outras portas e outros guardiões cada vez
maiores e mais poderosos.
Outra coincidência???
Conheço um lugar parecido, onde cidadãos comuns procuram a
Lei quando são acusados sabe-se lá do que e por quem, são barrados, não
conseguem ter acesso aos autos, precisam enfrentar um guardião poderoso e
ameaçador, e veem-se numa situação absurda!
Vocês conhecem algum lugar assim ou alguém nessa
situação kafkiana???